STF decide manter Lei que permite acesso a dados cadastrais sem autorização Judicial em casos de Investigação

O Supremo Tribunal Federal (STF), em recente julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4906, decidiu, por maioria, manter a validade do artigo 17-B da Lei 9.613/1998, com redação dada pela Lei 12.683/2012, referente à Lavagem de Dinheiro. Este artigo permite que autoridades policiais e o Ministério Público acessem dados cadastrais básicos de pessoas sob investigação — como qualificação pessoal, filiação e endereço — sem necessidade de autorização judicial prévia.

A decisão ocorre após a Associação Brasileira de Concessionárias de Serviço Telefônico Fixo Comutado (Abrafix) alegar que a medida violaria o direito à intimidade, à privacidade, à honra e à imagem dos indivíduos, conforme garantido pelo inciso X do artigo 5º da Constituição Federal. A Abrafix sustentou que a norma retiraria do Judiciário a capacidade de analisar individualmente a necessidade de flexibilizar a privacidade em cada caso, transferindo-a indevidamente para as autoridades investigativas.

O STF, contudo, formulou uma tese de julgamento destacando que a norma é constitucional, limitando-se a possibilitar o acesso apenas aos dados cadastrais específicos mencionados, sem incluir outros dados mais sensíveis.

Os Ministros Flávio Dino e André Mendonça, sucessores dos Ministros Rosa Weber e Marco Aurélio, não participaram da votação, mas os votos destes últimos foram considerados nas deliberações. A presidência do julgamento foi do Ministro Luís Roberto Barroso.

A ação 

A Abrafix contestou o artigo 17-B da Lei 9.613/1998, alterado pela Lei 12.683/2012, que trata da Lavagem de Dinheiro, ao ajuizar uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 4906) no Supremo Tribunal Federal. O artigo em questão autoriza que autoridades policiais e o Ministério Público acessem, sem necessidade de autorização judicial prévia, dados cadastrais de indivíduos sob investigação, dados esses mantidos por companhias telefônicas, financeiras, provedores de internet, administradoras de cartão de crédito e até pela Justiça Eleitoral.

A Abrafix argumentou que essa disposição legal impõe às operadoras de telefonia uma obrigação “manifestamente inconstitucional”, violando o direito à intimidade, privacidade, honra e imagem, conforme protegido pelo inciso X do artigo 5º da Constituição Federal. O dispositivo prevê que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas”, e assegura o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação. 

A entidade alegou que o artigo questionado diminui a proteção ao cidadão e, particularmente, aos usuários de telecomunicações, retirando do Judiciário a prerrogativa de analisar caso a caso a justificação para a flexibilização da privacidade, transferindo essa responsabilidade para as autoridades policiais e o Ministério Público.

Para a Abrafix, o direito à intimidade e à privacidade apenas pode ser afastado “mediante exame prudente e cauteloso de órgão investido de jurisdição, equidistante por excelência”. Na ADI, foi citado o entendimento do decano do STF, ministro Celso de Mello, de que “é imprescindível a existência de justa causa provável, vale dizer, de fundada suspeita quanto à ocorrência de fato cuja apuração resulte exigida pelo interesse público, a ser verificada em cada caso individual à luz dos critérios de adequação, necessidade e proporcionalidade”.

Além disso, a Abrafix sustentou que o dispositivo fere a Lei Geral de Telecomunicações e outras normativas que asseguram a confidencialidade dos dados dos usuários e exigem autorização judicial para o fornecimento desses dados. 

No inciso IX de seu artigo 3º, a norma estabelece o direito dos usuários dos serviços de telecomunicações “ao respeito de sua privacidade nos documentos de cobrança e na utilização de seus dados pessoais pela prestadora de serviço”.

A Abrafix também argumentou que o dispositivo questionado viola a Lei 10.073/2003, que estipula, no parágrafo 3º de seu artigo 1º,  “a relação entre o sigilo dos dados dos usuários e a necessidade de autorização judicial para seu fornecimento”, e a Resolução 426/2005 da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações), que aprovou o Regulamento do Serviço Telefônico Fixo Comutado e estabelece a obrigação da prestadora de zelar pela confidencialidade dos dados e informações dos usuários.

Diante disso, a associação solicitou ao STF uma medida cautelar para suspender a eficácia do artigo impugnado até que o mérito da ação seja julgado, buscando a declaração de sua inconstitucionalidade. O caso teve relatoria do ministro Celso de Mello.

*Com informações do STF