Audiência Pública na CCTI discute o uso da tecnologia e o excesso de telas na infância e na adolescência

A Comissão de Ciência, Tecnologia e Informática (CCTI) da Câmara dos Deputados realizou, nesta quarta-feira (14), uma Audiência Pública para discutir sobre o uso da tecnologia e excesso de telas na infância e na adolescência. O debate atende o pedido da deputada Luísa Canziani (PSD-PR). Em sua fala, a parlamentar destacou que as novas tecnologias trazem benefícios para a vida moderna, mas precisam ser utilizadas com parcimônia, principalmente por crianças e adolescentes. Além dos convidados, também participou da Audiência o deputado Capitão Samuel (PP/SE).

Entre os participantes, a representante da Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania, Marta Volpi, informou que o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda) formulou um grupo de trabalho com participação de vários ministérios, secretarias do governo e entidades da sociedade civil para formular uma política de proteção para as crianças no ambiente digital. Segundo a representante, o governo vai lançar um guia de proteção para o uso de telas para as famílias e escolas. Volpi também abordou que há um problema na transferência das tarefas de cuidado para as telas, por conta da sobrecarga de trabalho das famílias e ausência de espaços de cuidado.

Ainda sobre a família e espaços de cuidado, a Coordenadora do Comitê Gestor da Internet no Brasil (cgi.br), Renata Mielli, ressaltou a importância de se criar políticas públicas que ajudem famílias a deixarem as crianças mais longe das telas, com espaços de lazer públicos e investimentos na escola de tempo integral. Para ela, ainda que o acesso dessas crianças às telas seja uma realidade, é preciso criar mecanismos de escape para famílias que precisam trabalhar. Mas, há a necessidade de controlar o uso das telas das crianças, e o governo é o grande responsável para isso. No entanto, Mielli destacou que as redes sociais têm também uma grande responsabilidade. Para ela, um dos grandes problemas da presença massiva das crianças nas redes sociais é a exposição ilegal à publicidade e propaganda – que já é proibida pela legislação brasileira. De acordo com a mesma, é preciso regular as redes para proibir de forma exitosa que crianças menores de 13 anos criem perfis, e promover campanhas públicas para orientar as famílias. 

A Coordenadora do Grupo de Trabalho Saúde Digital da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), Evelyn Eisenstein, apresentou algumas recomendações de idade para o uso de telas na infância e adolescência. Segundo a pediatra, o principal problema é o uso prolongado das telas, sendo mais de 4 ou 5 horas por dia, o que pode levar à dependência digital, problemas de saúde mental, transtornos de déficit de atenção, hiperatividade do sono, sedentarismo, problemas visuais, auditivos e posturais, riscos para o desenvolvimento da sexualidade, entre outros. Ela acredita que pode haver uma forma equilibrada com limite de tempo pelos pais.

A Gerente de Políticas Públicas para Segurança e Bem-estar da Meta no Brasil, Tais Nigginegger, destacou que todas as redes sociais da Meta (responsável pelas redes sociais Facebook, Instagram e WhatsApp), proíbem crianças menores de 13 anos de possuírem acesso às redes sociais. A gerente ainda salientou que a Meta possui três princípios que norteiam o uso das redes sociais: Conexões responsáveis, proteção adequada a idade e inovação.

Nigginegger, ainda acrescentou que a plataforma disponibiliza ferramentas de supervisão para os pais, por meio das quais podem, por exemplo, ver quanto tempo o adolescente passou na plataforma e definir limites, visualizar quem o filho segue nas redes e se as configurações de privacidade foram alteradas. Ela informou que a empresa vem aprimorando as ferramentas para verificar a idade do usuário e destacou que buscam sempre aprimorar as ferramentas no sentido de proteger as crianças e adolescentes, ouvindo especialistas e promovendo pesquisas com adolescentes e seus pais. 

A Gerente de Relações Governamentais e Políticas Públicas do Youtube no Brasil, Alana Rizzo, acrescentou que a empresa não veicula anúncios personalizados para menores de 18 anos e que a família pode personalizar a experiência, tendo várias opções como o Youtube Kids, por exemplo.

A Diretora de Relações Institucionais e Governamentais da Associação Brasileira das Desenvolvedoras de Jogos Eletrônicos (Abragames), Raquel Gontijo,  salientou que a tecnologia já faz parte do cotidiano das crianças e dos jovens e é preciso promover o uso saudável e seguro, levando em conta não apenas o tempo de tela, mas a qualidade do uso, além de construir uma regulamentação equilibrada. 

O Gerente de Políticas Públicas do TikTok no Brasil, Gustavo Rodrigues, também informou que a plataforma disponibiliza ferramenta de sincronização familiar, que permite aos pais vincular a sua conta ao do filho adolescente e definir controles. Segundo ele, para todas as contas abaixo de 18 anos, o tempo diário de tela é de 60 minutos e, quando esse tempo é atingido, o adolescente só consegue continuar mediante a inserção de uma senha definida pela família. Além disso, para as contas abaixo de 16 anos, apenas amigos podem comentar nos vídeos e não podem ser enviadas e recebidas mensagens diretas. 

O fundador do Grupo de Dependências Tecnológicas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, Cristiano Nabuco, destacou que o Brasil é o terceiro colocado no mundo em dependência de telas entre crianças. Nabuco explicou que o uso excessivo de telas causa diversos problemas, como depressão, ansiedade, isolamento social e perda de memória recente, além de outros impactos cognitivos, como menor criatividade e prejuízos ao desenvolvimento da linguagem. Segundo ele, é preciso que, juntos, governo, organizações acadêmicas, especialistas em saúde pública e empresas estabeleçam padrões de uso saudável e seguro, adequados à idade, nas plataformas digitais. Ele ainda cobrou que as empresas compartilhem dados relevantes sobre o uso das redes por crianças e adolescentes.

O Diretor-Fundador do Data Privacy Brasil e membro-titular do Conselho Nacional de Proteção de Dados, Bruno Bioni, citou o Comentário Geral 25/21 do Comitê de Direitos das Crianças da ONU, que estabelece que a Convenção das Nações Unidas sobre os direitos da criança também se aplica ao ambiente digital; e a recente resolução do Conanda que responsabiliza todos, inclusive empresas, pela proteção dos direitos de crianças e adolescentes em ambientes digitais. Ele ainda destacou que no Congresso Nacional Brasileiro tramitam três projetos que tratam sobre o assunto.  Por fim, ele defendeu que deve haver uma responsabilidade compartilhada referente às plataformas, citando que as plataformas são as mais responsáveis pelos conteúdos em redes sociais e que devem ser incluídas em programas de políticas públicas que visam sua responsabilidade.

Para a Diretora do Instituto Alana, Isabella Vieira, há um fenômeno da superexposição da imagem de crianças e adolescentes por mães, pais e familiares, criando um rastro digital, que perdurará por muito tempo. Ela também citou outo impacto social que é surgimento de influenciadores mirins, sendo o trabalho infantil artístico no ambiente digital, que ainda não é regulado. A diretora ainda destacou um projeto realizado pelo instituto para que as crianças entendam o valor de estar offline com os familiares.

O que o Conselho Digital pensa?

Na medida que se discute políticas públicas para proteção das crianças e adolescentes na internet, devemos também nos debruçar sobre a proteção dos nossos jovens na Constituição Federal, no Estatuto da Criança e Adolescente, bem como sobre conceitos como responsabilidade compartilhada, supervisão parental e autonomia progressiva. Vale ler o conteúdo elaborado pelo Conselho Digital.